VAI NA FÉ
Na doença (quando a abordamos) muitas vezes o que provoca dor, não é apenas o físico, mas a incerteza, a fragilidade. Não nos passa pela cabeça, o sofrimento interior, de alguém quando é transferido de uma urgência, para um serviço, ou até para o bloco. O momento do espolio, quando a pessoa fica sem a roupa, os seus bens pessoais, feito num silêncio mecânico, descritivo, causa dor. A transferência feita numa maca, acompanhada por zelosos profissionais, caminhando para um elevador ou mais, causa dor, trauma. É um momento de solidão. As vezes também vou no elevador, e tenho vontade de segurar na mão do doente e dizer-lhe calmamente que vai correr tudo bem. Muitas vezes não é a doença que provoca dor, mas saber que ficou alguém muito querido a porta da urgência. É uma separação que procura respostas e sobretudo uma ansiedade tão grande que até o tempo chora.
Um dia chamaram-me ao bloco para ver um doente que segundos antes dos procedimentos, pediu assistência religiosa. Estava tão ansioso e nervoso que era difícil acalma-lo. Quando me aproximei, sem a mascara, toquei-lhe na mão e disse-lhe que tudo iria correr bem. Ele respondeu-me que apenas queria ver uns olhos e uma boca, ou seja um rosto que lhe desse confiança. Aqui esta o segredo. Não há doenças mas doentes. Por isso acho que os pormenores são importantes.
Gostaria de terminar com esta advinha. Há dois dias na vida de todos nós, mesmo que quiséssemos não poderíamos mudar nada. Que dias são esses??
Até breve
CM